terça-feira, 9 de junho de 2020

Já não sei o que é amar

Meus pais conheceram-se na escola primária. Meu pai, mais velho um ano que minha mãe, contava que olhava para a "carinha redonda e fofinha" da minha mãe e à medida que os anos passaram, ele dizia a todos que um dia casava com ela. 

Distanciaram-se por algum tempo na adolescência e inicio de fase adulta, e certamente tiveram seus namoricos, mas aos vinte anos, a vida voltou a junta-los numa destas festas tradicionais e nunca mais se separaram. Casaram num espaço de um ano e tiveram sua primeira filha. Um ano depois veio minha irmã do meio. Meus pais tiveram seus problemas, enfrentaram desemprego, situações de doença, mudanças inevitáveis, mas mantiveram-se sempre juntos. 

Seis anos depois de minha irmã do meio, eu entrei no cenário familiar, muito a contra gosto de meus pais, porque era mais uma boca para alimentar. Estávamos em 1974 e quem vive em Portugal e conhece nossa historia, sabe que foram tempos complicados para todos, antes e algum tempo depois. Mas a vida seguiu seu percurso.  Meu pai emigrou para Zurich, procurando dar uma vida melhor à família e minha mãe, lutadora, ficou cá com seu trabalho e 3 crianças pequenas para educar e criar.

Guardo verdadeiras preciosidades como memórias ricas de uma vida feliz até meus 11 anos. Apesar de muito doente, meus pais estiveram sempre na luta para que eu pudesse sobreviver à doença e hoje estou aqui graças a essa luta. Minha gratidão é mais do que imensa e jamais terei como agradecer o que fizeram por mim. 

Minha mãe morre aos 62 anos, vitima de negligência médica. Foi um choque para todos, algo difícil de esquecer e superar. O vazio que deixou, nada preenche e a vida, depois de perder nossa mãe nunca mais voltou a ser a mesma.

No dia em que minha mãe morreu, meu pai, aquele que eu conhecia, morreu com ela. Dali surge um novo homem, egoísta, violento, que nos afastou e casou com uma estranha, colocando-a na nossa casa, permitindo mexer no que era da minha mãe, sem questionar...

Dali vieram as discussões, os nossos porquês sem resposta e só ouvir que minha mãe era agora pó e que ele tinha direito de viver a vida como queria. Sim tinha, mas não a pisar a memória de nossa mãe e tudo o que com ela construiu. Não a pisar suas filhas. a afastar-se delas como se fossemos leprosos.

Passaram 13 anos desde aquele casamento apressado e hoje está demente, a carecer de cuidados de terceiros. Limpamos seu corpo debilitado, quando se suja como se fosse um bebé. Partilhamos tarefas com a sua segunda esposa, que por negligência e total falta de moral, destruiu nossa casa, danificou/partiu/perdeu as coisas que eram de minha mãe e alegando que fora por engano, andava a drogar meu pai com comprimidos para dormir. Foi parar demasiadas vezes ao hospital de urgência. 

Agora é que percebemos que um dia, quando falecer, teremos de dar a casa a este ser, que lapidou as contas do banco, deixando meu pai sem dinheiro algum. Que nos esconde quanto ganha de reforma, para nos obrigar a pagar por coisas, alegando não ter dinheiro. E nós filhas, sangue do sangue dele, não temos poder, algum, para o libertar deste pesadelo que ele próprio criou, nem nos libertar dele também. A lei, cega, não deixa e está neste caso, do lado que quem faz mal...

Agora eu pergunto, para onde foi o amor? É que com tudo o que vivemos desde que minha mãe faleceu eu digo que já não sei o que é amar... Meu pai, certificou-se que aprendêssemos duramente mais esta lição de vida...eu já não sei o que é amar...

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O ser mais doce que este mundo já produziu. O teu ar sereno, as tuas doces palavras, o teu aconchego.  Teu abraço, quando as lágrimas teimav...