Hoje não acordei sendo eu, quem
acordou foi uma espécie de zombie de mim…
Foi um zombie que se levantou da
cama e se preparou para mais um dia. A verdade é que não me sinto eu e atrevo-me
a dizer que nem sequer sinto o que quer que seja, pois estou apática. A alma abandonou
o meu corpo e agora estou em modo automático…
Não sei o que virá daqui e sinceramente
não espero o melhor. Se conseguires sair desta, será por um milagre e aí passarei
a acreditar que Deus está do nosso lado…porque por agora o diabo vence…
Estás hospitalizado, com um prognóstico
reservado e é impossível definir qual será o desfecho. E quando olho para ti
pai, frágil, impotente, desligado já do mundo que te rodeia, assusta-me pensar
no pior…
Eu perdoo-te…já te tinha perdoado
muito antes de tudo isto, mas só agora meu coração cedeu e aceitou que o teu
perdão já existia desde sempre. Como não poderia? És nosso pai e apesar de toda
a mágoa e dor que nos causaste não poderei guardar no meu coração raiva e
rancor contra ti. És nosso pai…
Eu perdoo-te também por mim,
porque o negro que trouxeste para nossa vida, já nos consumiu demasiado e a
nossa luta diária é contra algo sobrenatural e desumano. É a nossa cruz… mas
como poderei continuar presa a um sentimento negativo contra ti? Teria de ser
pior do que tu foste connosco.
Agora, a desilusão que causaste,
essa não vou fingir sequer que não está aqui comigo, porque está e estará. Cada
convívio, cada pensamento, cada movimento, mostra o quanto uma simples decisão infeliz
do teu lado, trouxe dor, medo, profunda tristeza e uma enorme injustiça. Como
não poderei estar desiludida contigo pai, se trouxeste o demónio para dentro de
casa?
Se ganhamos pequenas batalhas…não,
deixa-me te dizer que não ganhamos nada. Porque a bem da verdade quem ganhou
foi esse demónio que vive no nosso lar. Tudo o que foi feito e pensado, foi sempre
com o objetivo de favorecer o demónio e as pequenas batalhas que ilusoriamente pensámos
ter ganho, são na verdade vitórias dela. Ela sempre esteve três, quatro passos à
frente de nós e o tempo todo no controle. Desde que a colocaste lá em casa, nós
não tivemos, nem temos mais chance…
Toda uma vida a teu lado, mais de
40 anos sendo uma família, e tu deixaste tudo fugir no
vento, como cinzas que
desaparecem no ar. Não restou nada. Só dor, profunda tristeza e lamento…
Agora estás no limbo e arrastas-nos
também contigo. E se por caso tudo terminar brevemente, sais do limbo para o
descanso eterno, mas nós, tuas filhas, sangue do teu sangue, saímos para a
guerra. Guerra que não pedimos, que não queremos, mas que eventualmente virá,
por causa de uma simples decisão tua…uma simples decisão…mas eu perdoo-te pai!
Se tiveres de ir, vai em paz… e que Deus nos ajude!